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20 de Abril de 2024

Crimes ambientais: captação de água de Unidade de Conservação sem autorização ambiental configura crime

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Publicado por Maurício Fernandes
há 7 anos

Crimes ambientais captao de gua de Unidade de Conservao sem autorizao ambiental configura crime

“A 3ª Turma do TRF da 1ª Região, por unanimidade, deu provimento ao recurso interposto pelo Ministério Público Federal (MPF) contra a sentença, da 12ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal, que rejeitou a denúncia contra um acusado pela prática de crime contra o meio ambiente, tipificado no art. 40 da Lei nº 9.605/98, com base no art. 395, II e III do Código de Processo Penal (CPP). Consta dos autos que o proprietário de uma chácara foi autuado por ter causado danos diretos e indiretos à Unidade de Conservação Parque Nacional de Brasília e às suas áreas circundantes, ao instalar canos de PVC e mangueiras para captar água para uma chácara, sem autorização do órgão gestor, o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).

Em suas razões, o MPF alegou que o agente não praticou uma atitude de baixa ofensividade, visto que usou de 820m de canos de PVC, além de diversas mangueiras para criar um sistema ilegal de captação de água a qual abastece sua residência; que não se trata de pouco uso de água para própria subsistência, mas de captação de um recurso hídrico para fim de utilização residencial em várias tarefas. Disse também que a lesão jurídica não foi inexpressiva, pois foi considerado como dano médio pelo ICMBio e que não se trata de pessoa com baixo grau de instrução e nem de baixa renda.

Ao analisar o caso, a relatora, juíza federal convocada Rogéria Maria Castro Debelli, afirmou que, ‘em face da sua relevância constitucional, é evidente o interesse do Estado na repreensão às condutas delituosas que possam colocar o meio ambiente em situação de perigo ou lhe causar danos, em conformidade com a Lei nº 9.605/98’.

A magistrada destacou que a proteção constitucional ‘não afasta a possibilidade de se reconhecer, em tese, o princípio da insignificância quando há a satisfação concomitante de certos pressupostos: a) mínima ofensividade da conduta do agente; b) nenhuma periculosidade social da ação; c) reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento; d) inexpressividade da lesão jurídica provocada‘.

Porém, assinalou a relatora, que de acordo com o Relatório de Fiscalização do Ministério do Meio Ambiente (MMA) e do ICMBio, agente ambiental responsável pela fiscalização, atestou que a infração trouxe consequências negativas para a saúde pública e para o meio ambiente; que a gravidade do dano é de nível médio; que o autuado não é de baixa renda; que o cometimento da infração não ocorreu por motivo de subsistência do infrator ou de sua família; que houve danos em zonas de grande valor para a conservação de grau de proteção elevado e que o autuado não tem baixo grau de instrução ou escolaridade.

A magistrada entendeu que a conduta praticada não pode ser considerada como um crime que se consuma com a mera possibilidade de dano. O comportamento do acusado foi dotado de elevado grau de reprovabilidade, pois ele agiu com liberdade ao captar água de unidade de conservação para abastecer sua residência, demonstrando sua intenção em praticar a conduta delituosa ao longo do tempo, mesmo sem a autorização do órgão competente.

A relatora concluiu que nesse contexto, ‘evidencia-se sob a perspectiva das peculiaridades do caso, que não há como afastar a tipicidade material da conduta, tendo em vista que a reprovabilidade que recai sobre ela está consubstanciada no fato de o acusado ter captado água de local de grande valor para a conservação e de alto grau de proteção de unidade de conservação, sem permissão do órgão ambiental, em que pese a grave crise hídrica que atinge o Distrito Federal desde muito tempo‘.

Diante do exposto, o Colegiado, acompanhando o voto da relatora, deu provimento ao recurso para receber a denúncia e determinar o retorno dos autos à origem para regular prosseguimento do feito”.

Fonte: TRF1, 03/05/2017 (Processo nº: 0009296-75.2014.4.01.3400/DF)

Confira a íntegra do julgado:

RECURSO EM SENTIDO ESTRITO 0009296-75.2014.4.01.3400/DF

RELATOR (A):JUÍZA FEDERAL ROGÉRIA MARIA CASTRO DEBELLI – CONVOCADA

RECORRENTE:JUSTIÇA PÚBLICA

PROCURADOR:DOUGLAS IVANOWSKI KIRCHNER

RECORRIDO:WKD

ADVOGADO:DF00026328 – LEDA CAMILA PESSOA DE MELLO CARTAXO

RELATÓRIO

Trata-se de Recurso em Sentido Estrito interposto pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (fls.47/49) contra a sentença proferida pelo Juiz Federal da 12ª Vara da Seção Judiciária do Distrito Federal (fls. 39/43) que rejeitou a denúncia oferecida contra WKD pela prática do crime tipificado no artigo 40 da Lei 9.605/98, com base no artigo 395, incisos II e III do Código de Processo Penal.

Narra a inicial acusatória que o acusado foi autuado em 2/12/2013, por ter causado danos diretos e indiretos à Unidade de Conservação Parque Nacional de Brasília e às suas áreas circundantes, ao instalar canos de PVC e mangueiras para captar água para a Chácara Dalila, casa 2 do Núcleo Rural Esperança II, Brasília/DF, sem autorização do respectivo órgão gestor (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade – ICMBio).

Afirma o recorrente que o agente não praticou uma atitude de baixa ofensividade, visto que usou de 820m de canos de PVC, além de diversas mangueiras para criar um sistema ilegal de captação de água a qual abastece sua residência; que não se trata de pouco uso de água para própria subsistência imediata, mas de captação de um recurso hídrico para fim de utilização residencial em várias tarefas; que a lesão jurídica não foi inexpressiva, pois foi considerado como dano médio pelo ICMBio (fls.4/15); que não se trata de pessoa com baixo grau de instrução e nem de baixa renda.

Contrarrazões apresentadas às fls. 53/61.

Mantida a sentença recorrida à fl. 67/68.

A PRR/1ª Região manifestou-se às fls. 73/80 pelo provimento do recurso.

É o relatório.

Juíza Federal Rogéria Maria Castro Debelli

Relatora Convocada

VOTO

O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL recorre às fls.47/49 contra a sentença proferida pelo Juiz Federal da 12ª Vara da Seção Judiciária do Distrito Federal (fls. 39/43) que rejeitou a denúncia oferecida contra WKD pela prática do crime tipificado no artigo 40 da Lei 9.605/98, com base no artigo 395, incisos II e III do Código de Processo Penal, aplicando ao caso o princípio da insignificância.

Narra a inicial acusatória que o acusado foi autuado em 2/12/2013, por ter causado danos diretos e indiretos à Unidade de Conservação Parque Nacional de Brasília e às suas áreas circundantes, ao instalar canos de PVC e mangueiras para captar água para a Chácara Dalila, casa 2 do Núcleo Rural Esperança II, Brasília/DF, sem autorização do respectivo órgão gestor (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade – ICMBio).

Inicialmente, cabe ressaltar que a proteção, em termos criminais, ao meio ambiente decorre de mandamento constitucional, conforme prescreve o art. 225, § 3º, CF verbis: “(a) s condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados”.

Portanto, em face da sua relevância constitucional, é evidente o interesse do Estado na repreensão às condutas delituosas que possam colocar o meio ambiente em situação de perigo ou lhe causar danos, em conformidade com a Lei nº 9.605/98.

É certo que essa proteção constitucional não afasta a possibilidade de se reconhecer, em tese, o princípio da insignificância quando há a satisfação concomitante de certos pressupostos: a) mínima ofensividade da conduta do agente; b) nenhuma periculosidade social da ação; c) reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento; d) inexpressividade da lesão jurídica provocada

Todavia, a aplicabilidade do princípio da insignificância deve observar as peculiaridades do caso concreto, de forma a aferir o potencial grau de reprovabilidade da conduta, valendo ressaltar que delitos contra o meio ambiente, a depender da extensão das agressões, têm potencial capacidade de afetar ecossistemas inteiros, podendo gerar dano ambiental irrecuperável.

Pois bem, no Relatório de Fiscalização – Auto de Infração (fls.3/14) do Ministério do Meio Ambiente/Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade o agente ambiental responsável pela fiscalização atestou que a infração trouxe consequências negativas para a saúde pública e para o meio ambiente; que a gravidade do dano é de nível médio; que o autuado não é de baixa renda; que o cometimento da infração não ocorreu por motivo de subsistência do infrator ou de sua família; que houve dano em zonas de grande valor para a conservação de grau de proteção elevado; que o autuado não tem baixo grau de instrução ou escolaridade.

Na espécie, a conduta praticada pode ser considerada como um crime de perigo que se consuma com a mera possibilidade do dano. O comportamento do acusado é dotado de elevado grau de reprovabilidade, pois ele agiu com liberalidade ao captar água de unidade de conservação para abastecer sua residência, mediante a instalação de 820 metros de canos de PVC e mangueiras, demonstrando, assim, sua intenção em praticar a conduta delituosa ao longo do tempo, mesmo sem autorização do órgão competente. A conduta de causar dano à unidade de conservação configura crime contra o meio ambiente capitulado no art. 40 da Lei n. 9.605/98.

Nesse contexto, evidencia-se sob a perspectiva das peculiaridades do caso, que não há como afastar a tipicidade material da conduta, tendo em vista que a reprovabilidade que recai sobre ela está consubstanciada no fato de o acusado ter captado água de local de grande valor para a conservação e de alto grau de proteção de unidade de conservação, sem permissão do órgão ambiental, em que pese a grave crise hídrica que atinge o Distrito Federal desde muito tempo.

Diante disso, considerando que a inicial acusatória contemplou a qualificação do acusado, a classificação do crime e o rol de testemunhas, apresentou informações essenciais sobre a prática da conduta no contexto fático da fase preprocessual e expôs de forma satisfatória os elementos indispensáveis à demonstração de existência, em tese, do crime contra o meio ambiente, o seu recebimento é de rigor.

De acrescentar que a existência (ou não) de prova testemunhal acerca da compra da área com a instalação de canos para a captação de água em local proibido é matéria afeita à instrução processual, no curso da ação penal.

Do mesmo modo, não há falar em prescrição, considerando que da data do fato constatada pela fiscalização do órgão competente (2/12/2013) até o presente momento não decorreu o prazo prescricional previsto no art. 109, inciso III do Código Penal.

Isso posto, por tais razões e fundamentos, dou provimento ao recurso para receber a denúncia e determinar o retorno dos autos à origem para regular prosseguimento do feito.

É como VOTO.

Juíza Federal Rogéria Maria Castro Debelli

Relatora Convocada

EMENTA

PENAL. PROCESSO PENAL. ART. 40 DA LEI 9.605/98. CRIME CONTRA O MEIO AMBIENTE. CAPTAÇÃO DE ÁGUA EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO. AUTORIZAÇÃO. INEXISTÊNCIA. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE. DENÚNCIA QUE PREENCHE OS REQUISITOS DO ART. 41 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. RECURSO PROVIDO.

1. A proteção, em termos criminais, ao meio ambiente decorre de mandamento constitucional, conforme prescreve o art. 225, § 3º, CF verbis: “(a) s condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados”. Em face da sua relevância constitucional, é evidente o interesse do Estado na repreensão às condutas delituosas que possam colocar o meio ambiente em situação de perigo ou lhe causar danos, em conformidade com a Lei nº 9.605/98.

2. É certo que essa proteção constitucional não afasta a possibilidade de se reconhecer, em tese, o princípio da insignificância quando há a satisfação concomitante de certos pressupostos: a) mínima ofensividade da conduta do agente; b) nenhuma periculosidade social da ação; c) reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento; d) inexpressividade da lesão jurídica provocada

3. Caso em que no Relatório de Fiscalização – Auto de Infração do Ministério do Meio Ambiente/Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade o agente ambiental responsável pela fiscalização atestou que a infração trouxe consequências negativas para a saúde pública e para o meio ambiente; que a gravidade do dano é de nível médio; que o autuado não é de baixa renda; que o cometimento da infração não ocorreu por motivo de subsistência do infrator ou de sua família; que houve dano em zonas de grande valor para a conservação de grau de proteção elevado; que o autuado não tem baixo grau de instrução ou escolaridade.

4. Comportamento dotado de elevado grau de reprovabilidade, pois agiu o acusado com liberalidade ao captar água de unidade de conservação para abastecer sua residência, mediante a instalação de 820 metros de canos de PVC e mangueiras, demonstrando, assim, sua intenção em praticar a conduta delituosa ao longo do tempo, mesmo sem autorização do órgão competente. Inaplicabilidade do princípio da insignificância.

5. Na espécie, a denúncia está conforme o artigo 41 do Código de Processo Penal e não se encontra configurado quaisquer dos casos contemplados no artigo 395 dessa mesma Codificação. Narra de forma objetiva a conduta atribuída ao Recorrido, adequando-a, em tese, ao tipo penal imputado.

6. Recurso provido.

A C Ó R D Ã O

Decide a Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, dar provimento ao recurso, nos termos do voto da Relatora.

Brasília-DF, 5 de abril de 2017.

Juíza Federal Rogéria Maria Castro Debelli

Relatora Convocada

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